segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Ampliação de Conhecimentos: Catastrofismo Versus Uniformitarismo

Uniformitaristas e catastrofistas

A noção de que a história do Homem sobre a Terra tinha sido antecedida por uma outra história, anterior à sua presença, começou a tornar-se mais nítida no final do século XVIII. Os pesquisadores que procediam ao estudo da crosta terrestre, das suas rochas e dos fósseis que estas por vezes contêm, foram os primeiros a sentirem necessidade de se servirem de uma cronologia longa. As investigações realizadas tinham evidenciado, de forma clara, a existência de estruturas estratificadas cuja espessura e riqueza em fósseis marinhos bem conservados (conchas, corais, etc.) sugeria uma deposição extremamente lenta o que, por sua vez, implicava a aceitação de grandes extensões de tempo.

Os fenómenos geológicos passaram a ser explicados através de pequenas alterações imperceptíveis à escala humana mas significativas quando actuando durante milhões de anos. Porém, nem todos os defensores de uma escala de tempo longa aceitaram unicamente a actuação de causas lentas e graduais; para muitos esse imenso tempo podia ser interrompido por catástrofes violentas. Pode mesmo afirmar-se que a geologia europeia, da primeira metade do século XIX, foi dominada por correntes catastrofistas que se socorriam de causas bruscas para explicarem as principais mudanças ocorridas na crosta terrestre.

Uniformitarismo é a designação atribuída a um dos princípios básicos da Geologia. Este princípio, que é antes de mais um princípio metodológico, pressupõe uma uniformidade temporal dos processos geológicos e das suas causas. É considerado por alguns como sinónimo de actualismo e em oposição ao conceito de catastrofismo.

Contudo, este termo ainda hoje não possui um significado consensual. Além do significado anteriormente referido e que pode ser resumido na afirmação que o presente é a chave para o passado, também surge associado a outros dois significados: as leis da Natureza são uniformes; as mudanças geológicas processam-se de forma lenta e gradual, sem descontinuidades súbitas, nem catástrofes.

Este princípio uniformitarista já se encontrava presente na obra de Hutton, mas foi Lyell o responsável por fazer renascer as concepções huttonianas, numa Inglaterra que nos inícios do século XIX estava dominada pelas correntes diluvianistas, defendidas, entre outros, por dois naturalistas e clérigos anglicanos, William Buckland (1784-1856) e Adam Sedgwick (1785-1873), que tentavam conciliar os relatos bíblicos do Dilúvio com os registos geológicos. A presença de fósseis em zonas actualmente inabitadas e a descoberta de grandes mamíferos conservados em gelo, como os mamutes na Sibéria, era interpretada como tendo os continentes sido invadidos por águas diluvianas arrastando consigo seres que viveriam em locais longínquos. Lyell também foi um seguidor de Hutton, na medida em que tentou aplicar as concepções de Newton à geologia, pretendendo estabelecer os princípios básicos desta ciência, aproximando-a assim de ciências como a física e a química. Lyell e Hutton tiveram uma posição crítica face a outros filósofos e naturalistas da sua época, que acreditavam serem estáveis os sistemas naturais, introduzindo a ideia de que as forças geológicas é que eram estáveis e não os sistemas.

Embora Lyell fosse possuidor de uma formação inicial em Direito, cedo foi atraído para a geologia pelas conferências de Buckland na Universidade de Oxford. Contudo, não foi um seguidor das suas ideias, baseando toda a sua argumentação na aceitação do princípio que os acontecimentos do passado podem ser explicados com base nas causas actuais. Para Lyell, as causas que actuavam na Terra eram semelhantes às que tinham actuado no passado, não só em género como também em intensidade. Estas concepções entravam em discordância não apenas com Bukland e Sedwick mas também com outros contemporâneos seus (Cuvier, D’Orbigny, Élie de Beaumont) que defendiam uma interpretação das lacunas e das descontinuidades nos registos como resultantes de catástrofes naturais, embora aceitassem a antiguidade do nosso planeta.

A procura de evidências que lhe permitissem fundamentar as suas ideias, conduziu Lyell à realização de várias viagens pelo continente europeu. Estas viagens permitiram-lhe não só amadurecer as suas teorias como também estabelecer contactos com diversos outros naturalistas.

As interpretações do registo fóssil, feitas nesta época, foram influenciadas por diferentes quadros teóricos. Muitos dos que continuavam a procurar na Natureza uma evidência para as Escrituras, afirmavam que a Terra tinha sido povoada, a determinada altura, pelo Criador com seres semelhantes aos actuais. Contudo, outros, estavam conscientes da mutabilidade das formas naturais e de que a Terra escondia uma sucessão de outros mundos. Era um facto conhecido pelos naturalistas, desde há algum tempo atrás , que as ‘formações Secundárias’ continham fósseis de seres de reinos desconhecidos na actualidade, como por exemplo as amonites, belemenites e trilobites. Mas alguns ainda interpretavam este facto como resultado do desconhecimento de algumas das espécies que ainda viveriam no nosso planeta.

Para o avanço destes debates muito contribuíram os primeiros estudos de anatomia comparada, realizados com base em esqueletos fossilizados, que colocaram em evidência não serem os antigos seres semelhantes aos actuais o que, por sua vez, implicava a aceitação de que algumas espécies se teriam extinguido ao longo do tempo. É a Georges Cuvier (1769-1832), um dos principais defensores do catastrofismo geológico, que se atribui a criação da paleontologia dos vertebrados. Professor do Museu de História Natural em Paris foi uma das personalidades mais representativas e influentes do seu tempo. Este naturalista, associado normalmente ao fixismo biológico, considerou estar a Terra sujeita, com uma certa regularidade, a súbitas e violentas revoluções que provocariam a extinção da fauna existente. Estas fases de mudança brusca, seriam seguidos de períodos de estabilidade em que um nova fauna e flora voltariam a ocupar a superfície do globo, dando origem a uma outra era. Embora nos seus trabalhos não existissem quaisquer conotações de ordem religiosa, as suas ideias foram rapidamente adoptadas por aqueles que estavam interessados em encontrar uma fundamentação científica para o relato bíblico da criação.

Baseado no princípio da correlação dos orgãos, Cuvier tornou-se num dos principais defensores da teoria das criações múltiplas, defendo que os seres não se tinham sucedido uns aos outros por substituição gradual ou transformações morfológicas, mas sim por extinções repentinas. Cada uma das floras e faunas fósseis correspondia a uma nova criação de espécies. Como consequência desta teoria os diferentes seres deveriam encontrar-se circunscritos a determinados períodos de tempo, devendo ser encontrados apenas em formações atribuídas a essas épocas. Contudo, alguns naturalistas chamaram a atenção para o facto das investigações de campo evidenciarem que as floras e faunas fósseis não se encontravam bem delimitadas nos terrenos, pelo contrário, em certos locais encontravam-se vestígios de seres que alguns consideravam pertencerem a diferentes épocas. Estes dados pareciam evidenciar que a aparição e extinção de novas espécies se tinha processado de uma forma lenta e gradual, porém esta ideia não foi de imediato aceite, surgindo ainda outro tipo de explicações.
As concepções uniformitaristas dominaram a geologia durante o século XX, porém, nas últimas décadas, tem-se assistido a um renascimento do que se designa por neocatastrofismo. O problema da extinção dos dinossauros é representativo da co-existência de diferentes ‘olhares’ e interpretações sobre os mesmos dados, uns mais uniformitaristas, outros mais catastrofistas.

2 comentários:

Anónimo disse...

ola! :D

Dra. D. Maria Antonienta das Dores e dos Bolores disse...

Como geológa, o meu dever perante vossas excelências é informar-vos de que podiam melhorar um pouco. Obrigado pela atenção. Beijinhos e boa sorte.

Biologia e Geologia...

Ciências para o futuro!